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‘É preciso eliminar as barreiras’: pesquisadora da Fundação Carlos Chagas comenta modelos de concepção de deficiência

Em entrevista, Adriana Pagaime aborda orientações técnicas e políticas analisadas em sua trajetória de pesquisa

Autor- Jade Castilho,Pesquisas Educacionais em Pauta -10/01/2025 15:03:17

Em 2006, aconteceu a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência idealizada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em Nova Iorque, nos Estados Unidos. A partir disso, a concepção de deficiência, que também foi incorporada naLei Brasileira de Inclusão (LBI), o Estatuto da Pessoa com Deficiência, passou a ser: pessoa com deficiência é aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Barreiras são quaisquer obstáculos, atitudes ou comportamentos que limitem a participação social da pessoa e podem ser classificadas, de acordo com a LBI, como:

  • barreiras urbanísticas
  • barreiras arquitetônicas
  • barreiras nos transportes
  • barreiras nas comunicações e na informação
  • barreiras atitudinais
  • barreiras tecnológicas


"Essa concepção da Convenção, que tem status constitucional desde 2009,  se refere ao modelo social de deficiência. O foco então está nas barreiras impostas pela sociedade e não mais na ideia de que o indivíduo  deve se adaptar. Assim, é preciso eliminar as barreiras e investir em acessibilidade”, afirmaAdriana Pagaime, doDepartamento de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas (DPE/FCC). 

Do modelo médico ao modelo social 

De acordo com o Artigo 3º da LBI (2015), acessibilidade é direito que garante a participação e a utilização dos espaços com segurança e autonomia. A partir dessa perspectiva, a pesquisadora aborda o rompimento com o modelo médico, cujo foco estava no corpo e na lesão da pessoa, sendo ainda pouco sensível à diversidade e centrado nos cuidados da área da saúde. 

Já o modelo social amplia a compreensão da deficiência para além do campo médico e promove a perspectiva sociológica da deficiência, com uma visão biopsicossocial. Contudo, na prática, os dois modelos estão presentes na sociedade e impactam, especialmente, as políticas públicas. 

Estudantes com deficiência e o ingresso no ensino superior pelo Sisu

Emsua tese de doutorado, a pesquisadora analisou os editais do Sistema de Seleção Unificado (Sisu) de 2019 para o ingresso de estudantes com deficiência nas universidades federais. 

As pessoas com deficiência passaram a ser contempladas no rol de cotistas da política de reserva de vagas do Sisu somente em 2016 com a Lei nº 13.409, sendo necessária a condição estar atrelada a outras modalidades, como, por exemplo, a obrigatoriedade do candidato ter cursado o Ensino Médio na rede pública de ensino. 

Ao todo, foram mapeados os critérios de seleção de 62 universidades federais para identificar como as pessoas com deficiência teriam essa condição confirmada, ou seja, quais os procedimentos, critérios e exigências para um candidato se tornar elegível à política de cotas do Sisu. 

Entre os resultados encontrados no estudo, Adriana observou que as regras do Sisu se pautam na apresentação de um laudo médico com base no Decretonº 3.298/1999, o qual apresenta um rol de doenças para cada tipo de deficiência. 

A pesquisadora ainda destaca, na tese, que a LBI foi citada em uma normativa do Ministério da Educação (MEC) apenas em 2018 e que foi possível identificar um esforço de algumas universidades para se aproximar do modelo social, apesar da ausência de diretrizes do ministério. 

São mais de 30 políticas públicas, somente em âmbito federal, que amparam as pessoas com deficiência no Brasil e todas elas necessitam da comprovação dessa condição ainda por meio de um laudo médico, por isso a relevância desseestudoque aborda a coexistência de concepções de deficiência distintas.

A transição efetiva de uma visão médica de deficiência, que se pauta na ideia das adaptações, para o modelo social infelizmente ainda se mostra distante, embora tenhamos muitos avanços. 

Nesse sentido, a pesquisadora ressalta que: "Investir em políticasanticapacitistas, ou seja, que sejam planejadas a partir do reconhecimento da diversidade humana e que garantam a acessibilidade para todos, nos aproximará cada vez mais da sociedade inclusiva que as nossas normativas almejam”, completa Adriana.

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