Mediar o acesso ao conhecimento para garantir o direito à educação: pesquisador da FCC comenta fatores fundamentais para a formação docente
Rodnei Pereira, do Departamento de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas reforça a importância da parceria entre universidade e escola
Jade Castilho
17/10/2024 15:14:05
Pensar a formação de novos educadoras e educadores é olhar para a pluralidade e a complexidade de se aliar os conhecimentos advindos dos fundamentos da educação, como das ciências humanas, exatas, biológicas e linguagens, com as práticas pedagógicas e as diferentes maneiras pelas quais bebês, crianças, jovens, adultos e idosos aprendem.
Rodnei Pereira, professor e pesquisador doDepartamento de Pesquisas Educacionaisda Fundação Carlos Chagas (DPE/FCC), comenta os diversos aspectos da formação docente e de como a qualidade educacional é atravessada por ela.
Com base no projeto de nação que garante, em sua Constituição, a educação como direito, o pesquisador destaca a formação de professores como um problema crônico do Brasil. A baixa atratividade da carreira docente, por exemplo, se mostra como um dos fatores que inviabiliza o interesse dos estudantes por cursos de licenciatura ou pedagogia, no ingresso no ensino superior.
Dados divulgados peloCenso da Educação Superior 2023mostram que, dos 1,7 milhão de estudantes matriculados em cursos de licenciatura, 67% dos discentes estudam na modalidade à distância. O crescimento acendeu um alerta para o Ministério da Educação (MEC), que já observa o cenário há um tempo.
“A partir dos anos 1990, a educação passou a ser um bem de serviço. E isso abriu caminho para a mercadorização dos cursos de licenciatura. Não se trata de demonizar a Educação à Distância, mas não podemos fechar os olhos para o fato de que estamos diante de um grave problema, e a regulação e a fiscalização das instituições que oferecem cursos de licenciatura, especialmente à distância, precisam melhorar”, afirma Rodnei.
O pesquisador explica que o MEC anunciou, em maio de 2024,novas diretrizes para os cursos de licenciatura à distância, que determinam que 50% da carga horária dos referidos cursos ocorram presencialmente.
Aresolução CP nº 4/2024, do Conselho Nacional de Educação (CNE), determinou diretrizes curriculares nacionais para a formação inicial em nível superior de profissionais do magistério da educação básica.
Entre elas, está a carga horária de 880 horas para formação geral, que abrange conhecimentos sobre o fenômeno educativo e a educação escolar, 320 horas de atividades acadêmicas de extensão e 400 horas de estágio supervisionado.
Outro aspecto apresentado pelo pesquisador é a necessidade de ampliar vagas em cursos de licenciatura e pedagogia nas instituições públicas. Nesse sentido, é importante pensar no apoio ao acesso e permanência dos estudantes na universidade. O Censo da Educação Superior revelou que, no último ano, 51% dos alunos cotistas da rede federal concluíram o curso, enquanto o índice entre os não cotistas foi de 41%.
Ao analisar os efeitos doPortal Único de Acesso ao Ensino Superior (Prouni)verificou-se que 58% dos beneficiários concluíram a graduação no ano passado, contra 36% entre os estudantes que não fazem parte da política.
Além da oferta de infraestrutura de moradia e alimentação nesses locais, programas de incentivo e bolsas de auxílio financeiro, como o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência, fortalecem a permanência, o acesso e oferecem recursos para que os estudantes terminem os cursos e ampliem a educação superior no país.
A qualidade educacional
Unir teoria e prática, investir na parceria entre universidade e escola, com a interação entre o dia a dia profissional e as teorias educacionais, podem ser um caminho para a melhor formação docente, segundo Rodnei.
“Para se pensar em qualidade educacional, que é um termo difícil de definir, é preciso olhar para três aspectos: insumos, processos e resultados. Os insumos se referem aos materiais e infraestrutura para os professores trabalharem; os processos se referem à criação de condições, inclusive de gestão, que permitem aos professores empregar métodos e práticas de ensino diversificados, em escolas com clima positivo, em que as pessoas são respeitosas entre si, em que há espaço para troca de experiências, que garantem a formação continuada,que é um direito do professor; e quando você fala em resultados, é como isso tudo reverbera em aprendizagem, em curto, médio e longo prazo. É importante que esses três pontos caminhem juntos”, reforça.
Para o pesquisador, quem deseja ingressar na carreira docente precisa estar ciente dos desafios que vai enfrentar e do compromisso que todo professor precisa assumir, em mediar a aprendizagem do conhecimento escolarizado, para garantir o direito de todos e todas à educação.
“Quem quer ser professor tem que saber que está ali para garantir o direito ao conhecimento. Precisa ter consciência de que essa não será uma tarefa simples, nem fácil, mas deve também estar aberto para viver experiências incríveis. Não há nada mais gratificante do que ver um estudante ler sozinho, pela primeira vez, porque você mediou aquele acontecimento. Além disso, precisamos pensar que nunca foi tão importante pensar uma estética, uma ética da profissão docente aliada a uma perspectiva de que somos parte do mundo, e não de que o mundo está a nosso serviço e que vamos explorá-lo e extrair dele, de forma predatória, o que queremos e desejamos, sem o devido cuidado. Precisamos perceber o quanto somos conectados com este mundo, e esse encontro, na perspectiva da educação, pode ser belíssimo”, completa o pesquisador.
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