Nova proposta de sistema de indicadores se apresenta como ferramenta aprimorada para a gestão da educação municipal

Há diversas formas de retratar a estrutura e o funcionamento de uma rede de ensino e a mais utilizada é o painel de indicadores online, tal como feito por instituições governamentais, como o INEP, ou por organizações privadas, como o QEdu, para citar os mais conhecidos. Nesses painéis, seleciona-se um conjunto de indicadores e de dados educacionais e disponibiliza-se para consulta pública, oferecendo informações para diversos níveis de agregação, como escolas, municípios, unidades federativas e país, e para vários estratos de análise, como redes públicas e privadas ou localização urbana ou rural, por exemplo.

Essas ferramentas, contudo, não apresentam de maneira explícita o modelo que organiza as informações disponibilizadas. No caso dos Painéis Educacionais de Estados e Municípios do INEP, seu modelo retrata Trajetória, Contexto e Aprendizagem, o que sugere que foi construído para apreender resultados educacionais dos alunos, de um lado, e as condições físicas das escolas e o nível socioeconômico dos alunos, de outro. Já o Painel do QEdu apresenta também os resultados dos alunos e parece organizar as demais informações com base nos instrumentos de coleta de suas fontes de dados, apresentando-as de maneira compartimentalizada, conforme coletada por cada um dos questionários aplicados.

Essas formas de retratar uma rede de ensino, apesar de reunirem um conjunto de informações relevantes para a gestão educacional, mostram-se insuficientes para fornecer uma visão sistêmica e abrangente dessas redes. A fim de aprimorar o uso das informações à disposição dos gestores educacionais, especialmente os das redes de ensino municipais, realizamos uma pesquisa de pós-doutorado no âmbito do Departamento de Pesquisas Educacionais da Fundação Carlos Chagas (FCC), na qual se desenvolveu uma proposta de sistema de indicadores que objetiva fornecer aos secretários municipais de educação, mas também às organizações da sociedade civil, informações que sejam capazes de representar a estrutura e o funcionamento das redes de ensino da educação básica. O sistema permite relacionar, por meio das estatísticas e indicadores educacionais, os principais componentes e dimensões de cada rede (econômica, social, educacional, cultural, institucional e outras), o que viabiliza a apreensão da realidade na qual as redes operam.

Enquanto os painéis compreendem um conjunto mais restrito de indicadores e são usados dentro do escopo de gestão com o intuito de retratar as ações implementadas, como políticas ou programas, o sistema de indicadores proposto pode ser empregado para conhecer e acompanhar fenômenos complexos da realidade, dificilmente apreendidos por um único indicador ou índice, tal como a educação escolar ofertada por uma rede de ensino.

O modelo mais utilizado pelos sistemas de indicadores educacionais de diversos países, bem como o proposto para o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) no final dos anos 1990, é o composto pelos seguintes componentes interdependentes: contexto, recursos, processos and resultados. Esse também foi o modelo adotado para a proposta em tela, uma vez que sua mirada parte do sistema escolar como um todo, ao apreender as condições contextuais em que os recursos financeiros, humanos e materiais da rede de ensino são empregados nos processos pedagógicos e administrativos, para produzir um conjunto de resultados educacionais, definidos legal e politicamente. Na pesquisa, o modelo foi aprimorado, ao englobar um conjunto de parâmetros avaliativos e perspectivas analíticas com o intuito de melhor conhecer e avaliar os componentes e as dimensões das redes de ensino retratadas.

Assumir parâmetros avaliativos é relevante porque o retrato da realidade fornecido pelos indicadores do sistema é necessário, mas não suficiente para a tomada de decisão, uma vez que só é possível saber se tal situação da realidade está em conformidade com o esperado ou se requer intervenções para sua melhoria quando o resultado da mensuração é julgado a partir de parâmetros claros. Uma taxa de abandono escolar de 5%, por exemplo, desencadeará ações da secretaria da educação, como a busca ativa, somente se seus gestores avaliarem que esse resultado é inaceitável. Porém, se o considerarem como parcialmente aceitável ou até mesmo aceitável, por estar dentro do esperado, provavelmente nenhuma medida será tomada.

Além disso, analisar as informações obtidas por meio de várias perspectivas possibilita ter uma definição melhor do retrato feito, o que inclui a comparação da situação atual de uma rede de ensino com a de outras; a comparação da situação presente da rede com suas situações passadas, por meio da série histórica dos indicadores do sistema; a projeção de tendências e cenários futuros a partir dessa série e da comparação com sua situação presente; e a verificação da situação da rede em relação  aos objetivos planejados ou às obrigações legais vigentes.

Assim constituído, o sistema de indicadores permite, em síntese, representar, de maneira lógica e coerente a partir do modelo  adotado, a estrutura e o funcionamento das redes de ensino, conhecendo tanto suas dimensões (tais como a econômica, social, educacional, cultural, institucional etc.) quanto suas componentes (contexto, recursos, processos e resultados) e as relações estabelecidas entre elas. As informações assim produzidas podem, dentre várias possibilidades, contribuir para a tomada de decisões dos gestores educacionais, ao subsidiá-los com conhecimentos empiricamente fundamentados; contribuir para o diagnóstico, acompanhamento e apreciação dos planos decenais de educação dos municípios; fundamentar pedidos de financiamento ou participação em editais de programas oferecidos pelos governos estadual e federal; além de conferir transparência a respeito da situação educacional das redes de ensino, informando as organizações da sociedade civil que atuam nesse âmbito.

Os artigos e o relatório da pesquisa estão em fase de preparação, com publicação prevista para 2024.

Os argumentos presentes neste post são de responsabilidade dos autores e não necessariamente expressam as opiniões da Fundação Carlos Chagas.