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Escrita na educação infantil: linguagem, sentido e protagonismo

Desde os primeiros anos de vida, crianças devem vivenciar a linguagem escrita como forma de expressão e descoberta

Autor- Brenda Teixeira,Fluxo Educação -10/06/2025 13:18:13

Vivemos em uma sociedade letrada, na qual a escrita atravessa as práticas sociais e já faz parte do cotidiano das crianças, mesmo antes do período escolar formal. No entanto, é função da escola assumir o papel de mediar essa linguagem de maneira intencional, garantindo que a escrita seja uma experiência significativa desde os primeiros anos, e não apenas uma atividade centrada na repetição de letras e traçados.

SegundoMarisa Vasconcelos Ferreira, membra doDepartamento de Pesquisas Educacionaisda Fundação Carlos Chagas, afirmar que a linguagem escrita deve estar presente de forma significativa na Educação Infantil significa compreendê-la como uma prática social, com propósitos comunicativos reais e diversos. “Em uma sociedade letrada, usamos a escrita para uma miríade de situações,desfrutar textos literários, nos orientar no transporte público, fazer anotações, escrever memórias, contar histórias...”, afirma. É nesse contexto socialmente significativo que as crianças se interessam e se envolvem com a escrita, como mais uma linguagem para dar sentido ao mundo e a si mesmas.

No entanto, a pesquisadora alerta para um problema recorrente: “Na escola, em algumas formas de organizar as práticas escolares, a escrita acaba sendo ‘descolada’ do seu sentido maior, que é o seu uso, seu propósito comunicativo e interpretativo. Daí, ela fica muito desinteressante. E as crianças nos ‘dizem’ isso, das mais variadas formas.” Marisa destaca que, em observações de campo, é possível perceber essa diferença: de um lado, crianças diante de atividades xerocopiadas com letras soltas e pontilhados sem sentido; de outro, crianças engajadas com histórias, escrevendo (ainda que de forma não convencional), registrando descobertas e utilizando a escrita nas brincadeiras — como no faz-de-conta de restaurante, em que são criados cardápios, pedidos e contas.

As formas de trabalhar a escrita podem surgir dos bilhetes destinados a familiares e até mesmo das tentativas da criança de escrever seu nome ou palavras que fazem parte do seu cotidiano. Essas situações contribuem para a construção das primeiras hipóteses sobre o funcionamento da linguagem escrita e criam oportunidades para o protagonismo infantil e o início do processo de alfabetização.

ABase Nacional Comum Curricular (BNCC)estabelece que “na Educação Infantil, a imersão na cultura escrita deve partir do que as crianças conhecem e das curiosidades que deixam transparecer”. O documento também destaca que o contato com a literatura, promovido pelos educadores — mediadores entre os textos escritos e o universo infantil —, favorece o desenvolvimento das práticas de leitura, estimula a imaginação e amplia a compreensão de mundo.

No contexto escolar, a garantia de que a escrita esteja presente de maneira constante e integrada à rotina é fundamental. Isso envolve criar ambientes alfabetizadores, com grande e visível presença da linguagem escrita, e promover interações com textos variados: escrever uma carta para os familiares, cartazes para decorar a sala de aula, listas de materiais para uma brincadeira ou registros de experiências vividas pelo grupo. Como aponta Marisa, é essencial valorizar as produções das crianças, ainda que não correspondam à escrita convencional, pois práticas como a escrita coletiva ou individual em contextos lúdicos e socialmente significativos ampliam a aprendizagem.

O Programa Leitura e Escrita na Educação Infantil (Pro-LEEI), instituído pelo Ministério da Educação em 2025, reforça a importância deintegrar a linguagem oral, a leitura e a escrita na pré-escola, como forma de garantir experiências significativas e equitativas desde a primeira infância. Essas ações são especialmente importantes em contextos de vulnerabilidade social, onde muitas vezes o acesso aos materiais escritos e às práticas de letramento é limitado ou desigual.

O programa integra oCompromisso Nacional Criança Alfabetizada (CNCA)e segue princípios como a colaboração entre os estados, a valorização das especificidades da educação infantil, a integração entre etapas da educação básica e a promoção da equidade educacional. O CNCA visa assegurar o direito à alfabetização das crianças brasileiras até o final do 2º ano do ensino fundamental e foca na recuperação das aprendizagens das crianças do 3º ao 5º ano afetadas pela pandemia de Covid-19.

Investir na escrita na educação infantil é reconhecer as crianças como sujeitos ativos, capazes de produzir sentido, comunicar ideias e interagir com o mundo de maneira criativa e diversa. É também apostar em práticas educativas que respeitam o tempo da infância, valorizam a brincadeira, a experimentação e o protagonismo infantil como fundamentos do desenvolvimento integral.

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